Olhou ao seu
redor e pensou.
E por estar no
lugar errado, no dia errado, ela não disse nada. E tudo aquilo ficou guardado
para um momento posterior que lhe estava custando o fígado e junto com ele todo
o sistema nervoso, porque ele estava inteiramente nervoso.
E ficou ali,
jogada, tentando ser indiferente, mas por dentro queria ser transparente.
O barulho não a
incomodava, o que a incomodava era a presença, e ela estava dividida tentando
avaliar qual das presenças lhe desagradava mais, se a dela mesma ou a dos
outros que ali estavam.
Não era normal
um sentimento desses, ainda mais para ela que sempre lidava com situações
inusitadas, pessoas estraçalhadas e mais um monte disso tudo. Mas neste dia ela
percebeu que alguma coisa dentro dela havia mudado, pra pior, infelizmente, e
foi duro admitir isso a si. Sim, porque ela estava sentindo o peso da fraqueza
que a tomava. E queria revidar.
E assim,
reafirmou a si: a solução seria ser transparente.
Transparente é
um termo dual. E ela era transparente, de alguma forma.
Ela era
transparente porque permitia que a olhassem dentro dos olhos e descobrissem o
que se passava, era transparente porque condizia com o que lhe acontecia, não
disfarçava, não se escondia.
Mas a transparência
não pode ser entendida por pessoas não transparentes.
Assim, ela
almejava ser transparente de outra forma, daquela forma invisível, queria poder
passar despercebida no local onde estava, queria não estar ali.
Mas estava.
Lembrou-se,
então, daquele discurso de Veríssimo sobre defenestração. Defenestrar-se seria
uma boa opção. Não saiu do lugar, no entanto, escolheu outra forma de acabar
com momento, e no silêncio, partiu para um pleonasmo conveniente e “se auto
suicidou-se a si mesmo”. Cometeu o crime de comprometer seu fígado ao não
descanso e a queimar em amargura e ansiedade até ela mesma ter que levantar da
cadeira e beber um gole de água.
Depois, deixou
de olhar ao redor e de pensar. (No que fosse possível).